Desde que o mundo é mundo
temos em nosso meio uma célebre frase: “no meu tempo as coisas eram bem
melhores…”. Com certeza ela vem carregada de fortes ingredientes saudosistas e
alguns outros de desconhecimento histórico. Quando se fala do professor, essa
frase tem um peso ainda maior. Aqueles que hoje ultrapassaram os 40 ou 50 anos
de idade e tiveram a oportunidade de estudar são os mais enfáticos nessa
afirmação. Todavia, precisamos ter cuidado com as comparações, porque a
história mostra claramente os motivos que levaram nossa sociedade a
descaracterizar tão rapidamente o professor.
Não podemos nos esquecer
que até os anos 60 do século passado, estudar era um privilégio de poucos.
Menos de 30% das crianças tinham acesso aos estudos. Isso no chamado primário,
pois para seguir existia o exame de admissão – uma espécie de “bloqueador” da
continuidade – que só foi abolido nos anos finais daquela década. Privilégio
que o Estado garantia para suas classes mais abastadas ou com maior capacidade
de acesso por outros motivos, inclusive de localização territorial. Um dado que
pode demonstrar isso é o de que quando da universalização do ensino
fundamental, em 30 anos (1975-2005) o número de matrículas no norte do país
aumentou de 780 mil alunos para 3.350.000, enquanto no sul do país a evolução
foi de 3.590.000 para 4.228.000, ou seja, enquanto no primeiro foi da ordem de
329%, no segundo foi de 17%.
A universalização do
ensino fundamental iniciada no final dos anos 70 do século passado e alcançada
no ano 2000 foi acompanhada de uma série de outros fatores que levaram a
profissão de professor perder seu valor social e econômico. Os investimentos em
estrutura física não foram acompanhados por investimentos em pessoas. Pelo
contrário, o grande aumento na oferta de vagas foi acompanhado pela admissão de
profissionais com titulação inadequada para executar a profissão de professor,
barateando o valor do trabalho. Isso trouxe outro fenômeno: a necessidade de
“agilizar” a formação dos professores acabou trazendo para nossa realidade
“cursos rápidos” de formação de professores que diminuíram e muito a qualidade
dessa formação. Até bem pouco atrás tempo tínhamos cursos ditos universitários
para professores com duração de dois anos. Isso porque até 1997 mais de 50% dos
profissionais da educação só tinham o ensino médio completo.
Também nesse momento
histórico o fenômeno do trabalho feminino ganhava força no país. E essa “força
de trabalho emergente” na procura por seu espaço laboral, sujeitava-se a
remunerações muito abaixo das dos homens. Não só na educação, mas
principalmente nela isso foi determinante para as estratificações salariais
observáveis no magistério em nosso país. Explicando: o maior contingente de
professoras mulheres está na educação infantil e no ensino fundamental, onde os
salários são os mais baixos do país e onde a demanda de educandos é
infinitamente maior. Quando avançamos na hierarquia formativa, observamos uma
inversão nesse quadro. No ensino médio existe quase que uma paridade entre
homens e mulheres e no ensino superior, onde os salários são convidativos, a predominância
de homens é significativa.
Portanto, a desvalorização
do profissional da educação não aconteceu por acaso no Brasil. Hoje temos cerca
de 2,3 milhões de professores espalhados por este país vivendo realidades as
mais variadas. Só numa coisa eles têm uniformidade: sua desvalorização. É
aviltante acompanharmos o atual debate do piso salarial dos professores onde
diversos Estados e municípios não querem praticá-lo. Está mais do que na hora
de o governo federal aumentar sua participação nos investimentos da educação
básica. Dados de 2009 revelam que para cada R$ 1,00 investido na educação
básica, os Estados investem $ 0,41, os municípios $ 0,39, a União entra com
somente $ 0,20. Está mais do que na hora de os Estados e municípios aumentarem
seus investimentos na educação – 25% não são suficientes para atingirmos os
amplos objetivos educacionais que temos. Está mais do que na hora de se rever a
Lei de Responsabilidade Fiscal no que tange a folha de pagamento da educação,
já que a mesma é um fator inibidor para as esferas públicas investirem mais nos
salários.
Concluo dizendo que hoje o
maior desafio para nossa educação é a formação e a valorização do nosso
professor. Se não resolvermos essa equação, não teremos muitas perspectivas no
campo educacional. E isso não se dá com discurso. Só existe uma forma disso ser
conquistado: investimentos maciços no sistema educacional brasileiro. Só assim
poderemos ter além da universalização das vagas, professores reconhecidos e
capacitados para sua profissão e para a educação de nossos filhos.
Texto: Wilson Roberto Caveden é
gestor público com especialização em Economia e Relações do Trabalho, foi
secretário da Educação de Salto entre 2005 e 2011.
Imagens: Google imagens
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