Está nascendo, ou melhor,
renascendo, uma geração disposta a não ter fronteiras e a quebrar os antigos
rótulos que um dia impuseram a ela. E carrega consigo o nome 3T – “ Trocar o
Tricô pelo Teclado.” É isso mesmo. São homens e mulheres acima dos 65 anos que
decidiram abrir seus leques de oportunidades e decolar no mundo virtual. São vovôs e vovós que estão nas redes sociais, trocam e-mails, mensagens, rodam o mundo
com um só clique e se comunicam com o universo por meio das novas tecnologias.
Sabem mais que muito marmanjo por aí e garantem: estão mais jovens e felizes,
alguns até mais próximos dos netos e filhos. Para especialistas, otimistas com
essa revolução, a cada clique a geração 3T está beneficiando a mente e a alma,
já que a web pode ser uma das armas para evitar o mal de Alzheimer e a solidão.
Como toda e qualquer
revolução que se preze, essa, levantada por aqueles que já viram grandes
mudanças no mundo, ainda não é aderida por todos dessa faixa etária. Ainda há
resistências que a geração 3T quer derrubar, a fim de aumentar seu batalhão de
novos internautas e a efervescência ficar mais divertida. De acordo com uma
pesquisa divulgada em fevereiro pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e
Estatística (Ibope), a nova geração está começando aos poucos. O instituto
entrevistou 20.736 pessoas de 65 a 75 anos entre julho de 2011 e agosto do ano
passado, nas regiões metropolitanas das principais capitais do país, entre elas
Belo Horizonte. Segundo o estudo, 52% dos entrevistados afirmam que se
confundem com os computadores, mas no mesmo grupo, 28% já tratam de se manter
atualizados com os avanços tecnológicos.
Em relação ao uso da
internet, as pesquisas apontam crescimento no número de usuários seniores nos
últimos anos. Em 2012, de acordo com o Ibope, havia em todo o país 94 milhões
de brasileiros internautas. Em janeiro de 2013, os idosos representaram 1,95%
desse total, o que revela uma alta de 8,3% na comparação com o mesmo mês do ano
anterior. Quando comparado com 2011, esse aumento é ainda maior: 39,3%. “É uma
nova tendência. Existe cada vez mais a preocupação dessa turma em aprender e
estar atualizado”, comenta, satisfeito, o geriatra e diretor-geral da
Universidade Aberta da Terceira Idade, da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (Uerj), Renato Veras.
A satisfação do
especialista é porque, a cada clique, os novos internautas descobrem o mundo de
possibilidades que a web oferece. A geração 3T não quer saber mais dos velhos
estereótipos que seus avós um dia receberam. “Não queremos ser um grupo que se
isola, que fica em casa, faz tricô e pronto. Queremos participar e fazer barulho”,
comenta Maria Eugênia Cerqueira, de 65 anos, e uma das criadoras do blog
Amantes da Vida – um site com dicas culturais, gastronômicas e turísticas
voltado para os maiores de 50.
Apaixonada com esse mundo
virtual, Maria da Purificação Figueiredo Sepúlveda, de 74, mais conhecida como
Pupê, é internauta de mão cheia. Além do computador, tem um iPad por meio do
qual conversa com a filha Mônica, que mora na Alemanha. “Estou livre. Sou uma
pessoa ativa. A gente não pode ficar apática desse universo. Converso com
minhas amigas, meus filhos e netos pela web. Moro sozinha e, assim, estou
ligada a outras pessoas”, diverte-se.
E ela tem razão. De acordo
com estudos feitos no mundo inteiro, a web faz bem à saúde mental dos idosos.
Segundo pesquisa da Universidade do Arizona (EUA) divulgada este ano, o
Facebook pode ajudar pessoas idosas a manterem o cérebro “em forma.” Na Itália,
em 2011, os cientistas defenderam que a rede pode evitar a perda de memória. “É
uma forma de exercitar as funções cerebrais. A atividade física é muito
importante, mas é preciso exercitar a mente também”, avisa o presidente da
Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/MG, Rodrigo Ribeiro dos
Santos.
Um mundo de possibilidades
Para uma geração que uma
carta podia levar meses entre ser escrita e ser recebida, que se acostumou a
conversar por telefone fixo e conhece bem a ansiedade por um telegrama, o
computador e suas possibilidades assustam. Mas, quem foi que disse que essa
turma não quer se arriscar? Certos de que o melhor desta fase da vida é o tempo
livre e a vantagem de não ter pressa, os novos internautas não têm medo de
fuçar, errar e fuçar de novo. E assim foram pescados pela rede e suas janelas.
Para eles, o que era desafio se tornou companhia, entretenimento, juventude, saúde
e, acima de tudo, uma forma de se aproximar das gerações que já nasceram com
essas possibilidades a um toque das mãos.
O mouse ajudou Maria
Arminda, de 84 anos, a recuperar os movimentos do lado direito, comprometidos
por um AVC
Depois de ter perdido o
pai e outros parentes com Alzheimer, Maria Arminda Lopes pesquisou sobre a
doença e entendeu que era preciso se manter ativa para não sofrer dela. Em
1998, teve um câncer de tireoide e, em 2009, sofreu um acidente vascular
cerebral (AVC). Por dois anos ficou na cama, usou cadeiras de roda e precisou
de cuidadora. Hoje, Maria Arminda tem 84 anos e uma atividade intensa. Além da
academia, faz caminhadas, crochê e navega pela internet. O mouse, por exemplo,
foi uma ferramenta que ajudou Maria a recuperar os movimentos do lado direito,
afetado pelo AVC. “Tive meu primeiro computador aos 60 anos, não sabia nem o
que era um mouse. Fiz um curso de computação por uma semana e fuçando fui
aprendendo a mexer na máquina”, conta.
De tanto apertar botões
daqui e dali, Maria hoje mexe com jogos, Facebook e e-mails todos os dias. Além
da máquina, ela acessa sua caixa de e-mails pelo smartphone. “Mexo diariamente,
até quero comprar um notebook para poder usar quando viajar. Viajo muito e
quero estar conectada”, comenta Maria, que diz que o lado bom de estar com as
mãos ativas no teclado é trabalhar a mente. “A gente trabalha o raciocínio, se
atualiza com as notícias e se diverte. Tenho uma neta que está fazendo
intercâmbio e tenho mantido contato com ela, acompanho as fotos que ela posta
nas redes sociais e trocamos e-mails”, conta, satisfeita em dizer que sua mente
está a todo vapor.
Segundo o presidente da
Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia/MG, Rodrigo Ribeiro do Santos,
há dois grupos de idosos no Brasil: aqueles que usam as novas tecnologias, como
Maria, e outros que têm preconceito em usar e aprender, ficando completamente à
margem disso. “Os que usam estão tentando reduzir o isolamento social, estão
vendo aí um lazer e uma distração.” Rodrigo afirma que todos os cidadãos
deveriam fazer atividades sociais para manter o bom funcionamento cerebral. “O
medo do Alzheimer tem feito com que muitas pessoas estimulem suas funções
cerebrais com essas tecnologias”, afirma, lembrando que, antigamente, se dizia
que palavra cruzada era bom para evitar a doença, assim como o jogo de cartas
chamado paciência. “É bom, mas não é só isso. Tem que fazer atividades
variadas”, diz.
Ao usar as tecnologias, o
especialista aconselha o internauta a mexer com e-mails, jogos, notícias e
redes sociais como variedade de recursos para a mente. “São atividades com
características diferentes. As tecnologias estão suprindo uma série de demandas
e necessidades sociais. Há uma geração enorme que já nasceu com essas
tecnologias como parte da vida. E para outra que não teve essa intimidade com a
máquina. Por isso, ao ser tornar parte desse universo, se sentem mais jovens e
atualizados”, diz.
ENCONTRO DE GERAÇÕES
Que o
diga Adalberto Fernandes de Souza, de 70. Foi perguntando aos filhos e netos
que ele começou a mexer dali e daqui em computador. “Hoje, uso-o para redigir
textos, conversar pelo skyper, mandar e-mails e pagar as contas, é mais seguro
do que ir ao banco”, comenta, defendendo que, ao envelhecer, é preciso fazer
exercício para a mente para não deixar que falte alguma coisa. “A nossa
tendência é perder a memória, as lembranças. Por isso não podemos parar no
tempo”, defende.
Uma das paixões de
Adalberto Fernandes de Souza, de 70 anos, é se divertir na máquina com o neto
Samuel, de 8 anos (Beto Novaes/EM DA
Press)
Uma das paixões de
Adalberto Fernandes de Souza, de 70 anos, é se divertir na máquina com o neto
Samuel, de 8 anos
Mas uma das paixões de
Adalberto é se divertir na máquina com o neto Samuel, de 8. “Brincamos com os
jogos virtuais juntos. Ele me chama para jogar. Vamos trocando ideias e batendo
papo. É muito bom”, diz Adalberto. Ele conta que, dessa forma, está cada vez
mais próximo do neto, ao compreender a mesma linguagem dele. Essa conexão, de
acordo com Marisa Sanabria, integrante do Conselho Regional de Psicologia e
mestre em filosofia, é uma forma de acabar com o estigma da exclusão. “Assim, a
faixa etária não é vista com isolamento. Há um retorno imediato que traz a
sensação de fazer parte e de estar integrado nesse universo”, diz. Marisa
acrescenta ser fundamental esse movimento pela internet depois dos 65 anos como
forma de mostrar que, ao envelhecer, não se perde a convivência. “E se aproxima
das novas gerações, pois os códigos e diálogos se assemelham”, observa.
População de idosos
De acordo com dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os idosos – pessoas com
mais de 60 anos – somam 23,5 milhões de brasileiros, mais que o dobro do
registrado em 1991, quando a faixa etária contabilizava 10,7 milhões de
pessoas. Na comparação entre 2009 (última pesquisa divulgada) e 2011, o grupo
da terceira idade aumentou 7,6%, ou seja, mais 1,8 milhão de pessoas. Há dois
anos, eram 21,7 milhões de pessoas. São Paulo é o estado com o maior número de
idosos: 5,4 milhões. Em seguida vem Minas Gerais, com 2,6 milhões, e Rio de
Janeiro, com
2,4 milhões.
QUE TAL NAVEGAR?
Nunca pensou em usar essa
tal internet? Então, confira as dicas de especialistas para perder o medo e dar
o primeiro passo.
1) Procure um curso de
computação para impulsioná-lo a usar a máquina
2) Não tenha medo de errar
3) Pergunte sempre a
alguém sobre suas dúvidas
4) Tente fazer você mesmo,
e não fique nervoso com os seus erros.
5) Fuçar é uma maneira
interessante de conhecer os recursos dos computadores
6) Crie perfis nas redes
sociais, você vai rever amigos, parentes e conhecer
pessoas novas
7) Crie e-mails e outras
ferramentas para se comunicar
8) Nunca deixe de se
atualizar
Revolução digital
Era 1994. Gilberto Gil, que dispensa apresentações, empolgava o Brasil com sua canção Pela internet, em que apontava uma nova era de comunicação. “Eu quero entrar na rede/Promover um debate/Juntar via internet/um grupo de tietes de Connecticut”, cantava Gil. Assim como ele, naquele momento, muitos que acompanhavam essa revolução quiseram entrar nela. E quase 20 anos depois, ainda há muitos aprendendo, mostrando que não há idade certa para teclar, enviar, curtir ou compartilhar. E essa geração 3T (Trocar o Tricô pelo Teclado) quer ir além. Para eles, não basta só clicar ou mexer. Querem ter nas mãos as mais novas tecnologias e também produzir conteúdos para a rede.
(Leandro Couri/EM/D.A Press)
Exemplo disso é o site
Amantes da vida. No ano passado, três amigas decidiram criar um site
direcionado à geração com mais de 50 anos. A princípio, a ideia era reunir
dicas de viagens, bons espetáculos, restaurantes e textos bem-humorados que
elas gostavam de escrever e os amigos gostavam de ler e comentar. Mas a iniciativa
‘bombou” na rede , atingindo nada menos do que 80 mil acessos nos primeiros
meses.
Ana Maria Boucinhas, de 68
anos, Maria Eugenia Cerqueira, de 65, e Ana Devito, de 38, tiveram a ideia da
página depois que perceberam que não havia na rede algo direcionado ao lazer
daqueles com mais de 50. “Só se falava de problemas de saúde. Então, resolvemos
‘bombar’ o meio virtual com coisas divertidas e cheias de vida”, comenta Maria
Eugênia, confessando que a ideia foi bem aceita pelo público-alvo. “Os idosos não
querem ser excluídos dessa revolução na internet, querem participar e
produzir”, comenta.
Ela diz que o mundo
virtual acaba sendo um divertimento. “Temos uma amiga com mais de 60 anos que
encontrou um namorado pelo Facebook. Atualmente, está viajando para conhecê-lo
pessoalmente. É isso. Estamos vivos e fazemos parte dessa revolução da
comunicação”, diz Maria Eugênia. Esse sentimento de estar mais vivo é
compartilhado por Maria da Purificação Figueiredo Sepúlveda, de 74. Conhecida
como Pupê, ela conta que, no início, foi um pouco resistente ao computador. “Há
seis anos, comprei um. E achei a coisa mais maravilhosa do mundo. Sinto-me
sempre atualizada. Estou nas redes sociais, posto fotos das minhas viagens e
converso com os meus filhos”, diz.
Pupê tem quatro filhos,
mas mora sozinha. Uma das filhas, Mônica, há 20 anos mora na Alemanha, e
conversa diariamente com a mãe. Recentemente, Pupê ganhou um iPad. “Tem muita
coisa para fazer com ele. Mas o que é mais importante é conversar, pelo skype,
com eles. Conversamos sempre”, conta, satisfeita. Ela confessa ser sempre
ativa, o que é bom para a alma e a mente. “É muito bom estar conectada. Isso
ajuda nosso cérebro a funcionar mais.” É o que pensa também o cardiologista
aposentado Carlos Eduardo Ferreira, de 67. “Temos que nos preparar para esse
processo inevitável da memória mais prejudicada, com leitura, alimentação,
exercícios físicos e computadores. As redes sociais, por exemplo, nos levam a
pensar e, toda vez que pensamos, somos criativos.” Carlos criou, recentemente,
uma página no Twitter. “É uma oportunidade de exteriorizar o que se pensa.
Expor e trocar ideias. Todos os dias a gente aprende ou ensina algo a alguém.
Essas ferramentas virtuais multiplicam o nosso poder de comunicação. Temos a
possibilidade de entrar em contato com o mundo inteiro.”
CURSOS A demanda dessa
geração que renasce e quer aprender tudo sobre as novas mídias já tem reflexo
nos cursos. De acordo com Renato Veras, geriatra e diretor-geral da
Universidade Aberta da Terceira Idade, da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (Uerj), há na escola 3 mil idosos. “Temos 120 cursos, sendo que um dos
mais procurados é o de informática”, diz. Ele conta que o maior temor desse
público é a digitação. “Eles querem aprender e temos visto que a computação já
foi vista como impossível, mas não é mais. Eles estão vendo que são capazes e
podem se comunicar com o mundo”, diz.
Em Belo Horizonte, o
Serviço Social do Comércio de Minas Gerais (Sesc Minas), teve que formatar um
curso de informática para atender a demanda dos maiores de 65 anos.
“Atualizamos a grade, com redes socais, pesquisas e outros pedidos deles. O
curso começou no semestre passado e temos, atualmente, uma lista de espera”,
conta Érica Freitas, pedagoga e superintendente de educação do Sesc/MG. “A
única diferença é o tempo de aprendizado. No entanto, os idosos estão atentos e
querem aprender a mexer e a se comunicar”, conta, certa de que são
possibilidade e novas janelas que se abrem para o público sênior.
Fonte: EM.COM.BR
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