Com mais de 850 anos, a
Catedral de Notre-Dame é um dos símbolos de Paris desde sua construção.
Proposta pelo rei Luís XVII e pelo bispo Maurice de Sully, a igreja teve sua
pedra fundamental lançada em 1163 e só foi oficialmente completada em 1345,
quase dois séculos depois.
Idealizada como símbolo da
importância crescente de Paris na vida francesa — e europeia —, a Notre-Dame
não foi o primeiro templo religioso a ocupar o coração da Île de la Cité, no
que hoje é o quarto arrondissement da cidade. Nos tempos romanos, o local fora
ocupado por um templo pagão, que foi subsequentemente demolido para a
construção de duas basílicas.
Desde sua construção,
porém, a catedral de 128 metros de altura e 48 de largura se tornou um símbolo
universalmente conhecido de Paris e da França como um todo. Não à toa, é o
monumento histórico mais visitado da Europa, recebendo 12 milhões de visitantes
anualmente.
A catedral foi amplamente
celebrada pelos parisienses em 1963, quando completou 800 anos. Como é possível
ver neste vídeo gravado na ocasião, o monumento passou por um largo trabalho de
restauração na década de 60, que culminou nas festividades. Ele fez parte de
uma série de renovações propostas pelo então ministro da cultura, André Malraux
um dos muitos escritores e artistas que fizeram parte da história da catedral.
O CORAÇÃO DE PARIS
Mais do que o coração
simbólico de Paris, a Notre-Dame é também o literal centro da cidade. É logo em
frente à imponente catedral que fica, discreto e ao rés do chão, o marco zero
de todas as estradas da França. Ou seja, é a partir daquele ponto que todas as
distâncias no território francês são medidas.
SÍMBOLO DE UMA FRANÇA
PASSADA
Tomada por chamas nesta
segunda-feira (15/04/2019), a catedral parecia indestrutível. Ainda assim, não foram
poucas as vezes em que ela esteve em perigos reais de ir ao chão, tanto por
ação direta dos homens quanto pela ação do tempo permitida pelo descaso das
autoridades.
A cidade de Paris muitas
vezes esteve no coração de transformações políticas e guerras mundiais ao longo
dos últimos séculos, e a catedral não foi estranha a esses momentos. Na
Revolução Francesa, por exemplo, as forças revolucionárias destruíram muitas
estátuas e imagens no templo que remetessem ao catolicismo e à monarquia, dois
dos inimigos do ideal iluminista da época. A Notre-Dame chegou, inclusive, a
ser confiscada da Igreja Católica e utilizada como centro para celebrações
irreligiosas do regime, como o chamado Culto da Razão e o Culto do Ser Supremo,
estabelecido por Robespierre.
A catedral só voltou ao
comando do Vaticano com o fim do processo revolucionário, quando Napoleão
Bonaparte a devolveu à Igreja Católica e fez uma série de renovações no local,
então quase abandonado. Foi lá, inclusive, que o general corso se consagrou
imperador da França, dando ponto final à Revolução. E falando em realeza, foi
lá, no auge da Guerra dos Cem Anos entre os gauleses e a Inglaterra, que o
inglês Henrique VI se proclamou como rei dos franceses. Um evento traumático, a
coroação dos estrangeiros não foi bem aceita e a guerra não acabou como o
planejado, com Carlos VII assumindo o trono em Paris no fim das contas.
Napoleão Bonaparte foi coroado na Catedral de Notre-Dame em 02/12/1804. Neste dia ele retirou a coroa das mãos do Papa Pio VII e se coroou e em seguida coroou sua esposa Josefina. Isso demonstrou que ninguém teria mais poder que ele na França. |
VICTOR HUGO E SUAS
GÁRGULAS
Apesar das renovações
promovidas por Napoleão, a catedral continuou em estado de deterioração
profundo por algumas décadas. E foi isso que levou o escritor Victor Hugo, um
dos maiores nomes da literatura francesa, a fazer uma campanha pela renovação
da Notre-Dame.
O site da catedral mostrou em 2017 parte do estrago na arquitetura gótica (foto acima) que foi modificada ao longo
dos séculos. A construção teve início em 1163, mas levou mais de um século ser
finalizada e a sua história envolve muitos atos de vandalização, até que a
catedral foi o cenário escolhido para a história de Victor Hugo (1802 – 1885),
“Notre Dame de Paris“, que conhecemos como “O Corcunda de Notre Dame“, em 1831.
O autor francês tinha como objetivo conscientizar o público sobre a importância
de preservar a catedral, a colocando como o pano de fundo do romance histórico
que se passa em 1482, dentro e em torno da Catedral de Notre-Dame, na Île de la
Cité, no meio do rio Sena, em Paris. A Notre Dame era na época a principal
igreja de Paris e o autor a descreve como uma catedral com “mutilações,
amputações, deslocamentos das articulações”. E muito antes de virar um desenho
da Disney, era um romance destinado ao público adulto. Relembre abaixo o filme
de 1997 com Salma Hayek interpretando a cigana Esmeralda – papel que em 1956
foi de Gina Lollobrigida.
Foi por conta do sucesso
do livro que a construção passou por uma grande reforma em 1844, e são as
pedras, calcário e cimento dessa época que já estavam caindo aos pedaços , 173
anos mais tarde. Outras restaurações foram feitas: em 1967 os vitrais da nave
foram substituídos, e uma grande reforma foi feita na fachada na década de 90.
O espaço litúrgico foi
remodelado em 2004 e novos sinos entraram no lugar dos antigos em 2013. Mas
para essa restauração, não havia fundos disponíveis.
É por isso que, para bancar a reforma milionária, a arquidiocese de Paris
lançou a campanha Friends of Notre Dame, que visava arrecadar € 100 milhões entre 5 e 10 anos. Um comunicado no próprio site informava: “O estado da
catedral de Notre-Dame está de fato em um nível que as suas estruturas em breve
não mais desempenharão o seu papel e ameaçam a estabilidade do monumento, sem
mencionar a perda definitiva de decorações esculpidas”, citando ainda “as
gárgulas caem”. “Elas são como sorvete sob o sol”, definiu Michel Picaud,
diretor do Friends of Notre Dame.
O comunicado informa ainda
que “a grave degradação é o resultado de um processo lento que não poupa mais
nenhuma parte da catedral”.
AMEAÇAS HISTÓRICAS
A história da catedral — e
da França — não pararam por aí. Basta lembrar que, depois de Victor Hugo, Paris
ainda viveu uma série de momentos-chave nos séculos seguintes.
Ela foi um dos
principais palcos de eventos como a
- Comuna de Paris,
- a guerra franco-prussiana,
- a primeira e a segunda Guerras Mundiais
- e até mesmo as revoluções culturais de 1968.
Um dos exemplos dessa
iminência de possíveis danos à Notre Dame pode ser visto nas cenas finais do
filme Paris está em chamas? Nelas, as tropas aliadas liberam a Île de la Cité
do jugo alemão, em 1944, e o seguinte diálogo acontece:
— Conseguimos, vencemos a
corrida!
— E onde estamos?
— Em frente à Notre-Dame.
— E como ela está?
— Assim como eles falavam.
Grande... e linda! Com duas torres.
FIGURA CARIMBADA NAS ARTES
Assim como no caso de
Paris está em chamas? e do livro de Victor Hugo, que serviu de inspiração para
a também muito popular animação da Disney O Corcunda de Notre-Dame , a catedral
inspirou artistas do mundo inteiro por muitas gerações.
São incontáveis os
quadros, filmes, livros e músicas que prestam homenagens ao monumento ou
representam a catedral em si. Na sétima arte ela aparece constantemente para
representar Paris. Basta ver longas como Meia-noite em Paris e O equilibrista .
E não foram só os franceses que demonstraram seu amor pelo prédio. O argentino
Julio Cortázar, que passou boa parte de sua vida em Paris, cita a Catedral em
um trecho de seu romance O jogo da amarelinha : "A noite em que nos
encontramos detrás da Notre-Dame".
REFERÊNCIAINTERNACIONAL
EM ARQUITETURA
Além de servir como
inspiração para artistas e de ser palco importante dos desenrolares da história
francesa, a Notre-Dame também é uma referência por si só. Sua arquitetura
gótica é um dos mais belos exemplos no estilo, servindo de base para muitas
outras igrejas construídas depois. Seus arcos, naves, torres, vitrais e
estátuas se tornaram símbolo de Paris e da Igreja Católica pelo mundo. Até
mesmo seus sinos e órgãos são considerados hoje patrimônios inestimáveis da
cultura mundial.
As perdas causadas pelo incêndio, portanto, são incomensuráveis para disciplinas tão distintas como a história da arte, engenharia civil e teologia. #LUTO
As perdas causadas pelo incêndio, portanto, são incomensuráveis para disciplinas tão distintas como a história da arte, engenharia civil e teologia. #LUTO
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